Por Eng.º Marcelo Nascimento
Consultor Especialista em Transporte Vertical de Passageiros
A discussão sobre equipamentos sustentáveis no segmento de transporte vertical de passageiros é muito ampla e vasta. Passa pela eficiência energética dos comandos e das máquinas de tração, especialmente para aplicação em elevadores, pelo esquema de montagem dos equipamentos (que podem tornar a obra civil mais eficiente), estratégias de atendimento, inclusão de sistemas regenerativos, mas também por eliminar o uso de óleos nos processos de lubrificação das máquinas e das guias e por projetos com componentes mais duráveis, de maior vida útil.
Normalmente, portanto, ligadas a novos produtos e/ou à modernizações e atualizações de tecnologia. Mas é possível incluir os serviços de manutenção nessa discussão? Especificamente, falando de reparo de componentes eletrônicos?
Para introduzir esse assunto, é importante abordar alguns paradigmas sobre a reposição de peças. É surpreendente, em pleno século XXI, era da produção compartilhada, ter quem acredite que o acesso às peças dos elevadores é exclusividade apenas das empresas fabricantes/montadoras, como se estas fabricassem todas as peças aplicadas nos equipamentos, e que não fosse ilegal fazer qualquer restrição ao comércio de peças, vinculando-a, por exemplo, aos serviços de manutenção, em uma ilegal venda casada.
Tão surpreendente quanto, é acreditar que se o serviço de manutenção não estiver com a montadora, o elevador será sucateado, com aplicação de peças recondicionadas. Prestar um serviço adequado, com segurança, inclusive utilizando peças de genuínas e de qualidade superior, com a quantidade de informações e fornecedores de excelência disponíveis no mercado atualmente, é uma decisão, possível às empresas que assim desejem fazê-lo.
E é a partir desse gancho, inicialmente colocado de maneira pejorativa, que desejamos refletir: qual o problema de realizar reparos em componentes, especialmente eletrônicos, desde que dentro da melhor técnica? Por que trocar o componente por um novo, mesmo consciente que a falha é pontual, num componente do conjunto? Certo que em nossas reflexões, a melhor técnica será sempre uma premissa, e ela vale para tudo e para todos, inclusive para quem fabrica elevadores e peças novas.
Obviamente que o assunto pede uma ampla discussão, e é muito polêmico. Mas até quando, nos “esconderemos” e evitaremos tratar claramente sobre o tema com nossos clientes? Sim, o reparo de conjuntos eletrônicos é uma alternativa de manutenção, confiável e, em alguns casos, economicamente viável.
Não em todos os casos, porque há de avaliar as condições gerais da placa ou módulo eletrônico, por exemplo. O seu nível de integridade, aspectos construtivos. Para alguns casos, o custo de produção de uma placa nova é inferior ao do reparo. Porque é preciso considerar ter os recursos mínimos disponíveis em laboratório para garantir um processo de controlado e eficaz, e isso representa também um custo, e porque a produção de alguns conjuntos mais simples, seja pela baixa complexidade, ou por volume de produção, pode não justificar o investimento no seu reparo.
Mas imaginemos, a luz da sustentabilidade, simplesmente descartar todas peças eletrônicas, quando houver qualquer falha de seus componentes, por menor que seja. Sabemos que o lixo eletrônico, de maneira geral, tem tempo de decomposição superior a 100 anos, quando não considerado infinito (que não se decompõem). Causa diversos danos ambientais, sendo que o principal é a contaminação por metais pesados, com consequente danos à saúde pública, ao meio ambiente e a redução do tempo de vida dos aterros.
Então, até que ponto temos uma cultura sustentável no nosso segmento? Será que “apenas” aprimorar e adaptar os produtos novos/modernizados a esse conceito é suficiente mesmo?
O reparo de conjuntos eletrônicos em especial, e que pode ser ampliado a outros conjuntos, associado ao descarte adequado para reciclagem, é ser sustentável. É fazer uma cobrança justa, é ter um consumo racional. Valorizemos produtos com interoperabilidade, sem barreiras de tecnologia, e que se proponham a adotar procedimentos sustentáveis também na manutenção.
Destacar que a reciclagem permite o destino adequado desse lixo eletrônico, evitando que milhões de toneladas do mesmo agridam o meio ambiente. Das placas de circuitos eletrônicos podem ser recuperados os metais, inclusive ouro e prata em alguns casos, e até é possível utilizá-las como matéria-prima para produção de novas peças.
Porém, também é preciso cuidado para que nosso discurso esteja alinhado com ações práticas. Especialmente empresas que “brigam” para levar as peças defeituosas do estabelecimento, mas por outro lado não oferecem ao mesmo de maneira clara a alternativa de reparo, apenas sob a rasa justificativa de que “o certo” é apenas, ratificamos, apenas, utilizar peças novas. Ratificamos também: nem sempre haverá essa alternativa, em outras vezes, o reparo não é viável (técnica ou economicamente), mas ele existe e é uma solução confiável!
Além de cuidar da segurança de nossas operações, de prover o acesso às pessoas de maneira indistinta, de permitir que os serviços sejam experiências agradáveis aos nossos clientes, precisamos desenvolver ações (em produtos e serviços) para manter o equilíbrio entre nossas atividades e o mundo que nos abriga, inclusive o meio ambiente. Desenvolvimento sustentável é melhorar o mundo, ainda que fazendo apenas nossa parte.
Sobre o autor
Marcelo Nascimento
Engenheiro Mecânico, pós graduando em Avaliações e Perícias de Engenharia e também Administrador de Empresas. Está no segmento de elevadores, mais especificamente atuando na Bahia, desde 1998. Começou na Elevadores SUR, que atualmente é ThyssenKrupp Elevadores, onde ficou até 2010. Desde 2011 atua na Expel Elevadores, empresa regional que atua com manutenção e modernização, onde é socio e responsável técnico.
É presidente do SECIEB – Sindicato das empresas conservação e Instalação de Elevadores da Bahia. Atua também como consultor, associado ao IBAPE/BA – Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia e em projetos especiais de aparelhos de transporte vertical – planos inclinados e teleféricos – tanto atualização técnica, quanto manutenção.
Exerce à docência no curso para formação de síndicos profissionais da ACS FORMA, parceira da ACS Administração de Condomínios com o Grupo Educacional Unidom. Iniciou recentemente como consultor do programa Cadê o Sindico no Radio, na Metrópole FM de Salvador/BA.